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Maria Ho - WSOP 2018
Maria Ho - WSOP 2018

Se antes a televisão – e apenas ela – mostrava quem eram os ídolos do poker, e começamos a gostar de jogadores como Mike Matusow (eu mesmo nunca gostei), Layne Flack e Ted Forrest, por exemplo, o acesso à informação de resultados, o poker online, e massificação do jogo certamente foram elementos que ajudaram a desconstruir alguns desses mitos que apareciam na telinha.

Com Maria Ho o caminho parecia ser – mas não é – o mesmo. Com quase US$ 3 milhões em ganhos nas mesas, não chega a ser uma unanimidade técnica, mas ocupa uma posição de destaque na indústria do poker, com forte presença midiática, dividindo seu tempo entre os torneios que joga e os que comenta, e bem.

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Nossa entrevista foi combinada no salão do PCA, onde Maria se dividiu entre as duas atividades. Primeiro ela comentou o PSPC, depois jogou o Main Event e obteve um honroso 29o posto, que lhe valeu US$38.000. Acessível e simpática, disse que poderia conceder a entrevista naquela mesma hora, mas este repórter não estava preparado para tanta presteza. Ela disse então: “Em duas horas posso voltar. Está bom para você?”. Disse sim e com pontualidade britânica, a nativa de Taiwan e criada na Califórnia, chegou na hora certa. Bem na hora que eu trocava ideia com Joaquín Melogno, monstro sagrado do poker uruguaio, e que me contava como tinham sido seus primeiros movimentos nas mesas em Bahamas.

Maria Ho - WSOP 2018
Maria Ho – WSOP 2018

Maria não fez qualquer exigência, respondeu todas as perguntas com muita convicção e clareza, não teve pressa para finalizar a entrevista e até topou falar o que pensa sobre Donald Trump. Confira:

Sobre o seu papel como comentarista, como você se sente? Como você faz para “mudar a chave” de jogadora para comentarista?
Por sorte, existe uma habilidade que é similar nas duas atividades, que é meu conhecimento de poker, mas é claro que às vezes você pensa o poker de uma maneira, mas para explicar para outras pessoas pensa de outro jeito. Foi uma área em que precisei trabalhar, mas gostei do desafio, porque no poker, quando você está jogando, está pensando em tudo, mas em sua própria cabeça, não está dizendo em voz alta. Então ser comentarista me ajudou não só a articular melhor meu raciocínio, mas também ajudou a me atualizar sobre coisas que não tinha que dizer em voz alta sobre poker e que agora vem de forma natural para mim. Creio que isso ajudou meu jogo, porque se você fica um tempo sem jogar e volta, sente que não está ‘fresco’ na mesa, mas quando estou comentando, sinto que sigo constantemente pensando sobre poker.

Como você divide seu tempo hoje entre jogar e comentar?
Eu diria que faço 50/50 no momento. Eu ainda amo jogar, mas comentar me tira da mesa também, porque às vezes eu acordo e não tenho vontade de jogar, você tem que querer para conseguir jogar o seu melhor. Nesses dias, é bom ter a opção de comentar, porque eu ainda amo assistir a outros jogando, ainda sou uma grande fã do jogo, e isso me permite estar envolvida sem precisar estar na mesa.

Sobre sua carreira de jogadora, quais são seus planos e metas no momento?
Eu ainda viajo bastante para jogar e é claro que ainda é um objetivo meu ganhar um grande torneio. Eu já ganhei torneios, mas nunca um torneio “major”, seja ele um evento da WSOP, um título do EPT, isso é algo que eu sempre buscarei alcançar antes de me aposentar no poker. Então meu plano ainda é seguir viajando, fazendo transmissões, talvez me aventurar um pouco mais nos eSports, que já faço um pouco e é algo que se tornou tão grande. Espero que consigamos achar pessoas dos eSports que se interessem por poker também, então seria bom para mim esse intercâmbio.

Quando você começou a jogar poker, imaginava que faria comentários, participaria de eSports, ou pensava apenas em jogar? Como foi?
Quando eu comecei no jogo, foi antes do Moneymaker ganhar o Main Event da WSOP, antes do “boom” do poker, das pessoas perceberem que o poker era interessante até para assistir. Claro que o poker se tornar popular me ajudou a encontrar uma carreira, mas eu gostava do jogo mesmo antes disso acontecer. Nunca pude imaginar que haveria tantas oportunidades, é tão bom poder hoje falar para meus pais que eu realmente consegui construir uma carreira no poker, não era apenas um hobby, já estou fazendo isso há mais de 12 anos.

Maria Ho - WSOP 2018
Maria Ho – WSOP 2018

Quem são seus melhores amigos no poker? Suas influências, ídolos…
Um dos meus amigos próximos há bastante tempo é Daniel Negreanu, foi uma das primeiras pessoas que eu conheci quando cheguei no poker. Pela forma como me tornei uma embaixadora do jogo, Daniel foi a inspiração perfeita nesse aspecto. Ser próxima dele, ver como interage com fãs, a forma como ele é positivo sobre o jogo, tudo isso me inspirou a fazer o mesmo, porque vi que muitos se interessam pelo jogo por causa dele. Eu espero poder seguir o mesmo caminho, ajudando a trazer mais pessoas para o poker e ajudando a lembrar que o poker é divertido e nem sempre tão sério como se vê por aí.

Eu venho do Brasil, onde o jogo é bem divertido. Você já esteve lá?
Nunca fui para o Brasil, mas já vi muitos vídeos de torneios de poker no Brasil, onde, como você disse, as pessoas estão se divertindo, aproveitando o momento. Há mais comemoração, as pessoas falam mais, esse é o tipo de ambiente que eu acredito que ajuda o poker a crescer, então definitivamente quero visitar algum dia e jogar poker no Brasil.

Pode ter certeza que será bem recebida. Sobre mulheres no poker, a participação feminina no jogo está se desenvolvendo ou não, qual é sua opinião sobre isso?
É engraçado, porque quando eu comecei no poker havia tão poucas mulheres, principalmente da minha idade, mais jovens. A maioria das mulheres que eu encontrava jogando eram um pouco mais velhas e estavam no poker há bastante tempo. É claro que hoje você olha e vê mais mulheres, em termos de mais jovens, que jogam torneios maiores, buy-ins mais caros, mas ainda não se vê uma porcentagem maior de mulheres, isso ainda é um problema. Eu não acho que o número de mulheres cresceu, mas agora elas estão mais vísiveis, porque jogam melhor, têm mais resultados, então começaram a focar mais nelas. No entanto, a estatística ainda é de 3% a 5% de mulheres, então me preocupa que mesmo uma década depois eu ainda não vi o número chegar a 10%.

Como você viu a vitória da Maria Lampropulos aqui no Main Event do PCA no ano passado?
Obviamente, foi ótimo, porque é bom ver uma mulher ganhar e melhor ainda uma mulher que sabia o que estava fazendo. Às vezes não é uma boa representação, porque quando uma mulher ganha, não querem dar muito crédito, dizem que foi apenas sorte, mas ficou bem claro que Maria Lampropulos sabia o que estava fazendo. Então gostei que ela mostrou ter a habilidade para bancar o título, foi muito merecido, então foi animador ver alguém assim levando um grande título. Espero que mais mulheres se sintam confortáveis para jogar e ganhar também.

O que você costuma fazer no seu tempo livre?
Eu sou uma pessoa simples. Quando você é jogador profissional de poker, as pessoas pensam que você tem esse estilo de vida glamouroso, de viagens, mas quando não estou jogando ou participando de transmissões, gosto de ficar em casa, relaxar. Gosto de passar tempo com minha família e amigos, porque passo tanto tempo longe deles que, quando estou em casa, eu quero apenas ir ver um filme, sair com eles.

Onde você vive?
Eu vivo em Los Angeles, é onde toda minha família vive e eu moro lá desde os cinco anos de idade.

Você nunca morou em Vegas?
Eu fiz faculdade em San Diego, então morei lá por quatro anos enquanto estudava, e também tinha um lugar em Las Vegas durante o ano passado, mas eu passou mais tempo em Los Angeles do que em Vegas.

Quem é seu jogador favorito no circuito?
É diferente, porque existem jogadores que eu respeito e admiro, mas não chamaria de meus favoritos. Existem pessoas que eu admiro há muito tempo, como Isaac Haxton, que conquistou tanto sucesso no jogo durante um longo período de tempo e você consegue ver que ele realmente ama o jogo. Mas eu não diria que ele é meu jogador favorito para assistir, porque é mais sério, joga mais no estilo da nova geração. Acho que meu jogador favorito para acompanhar ainda é Daniel Negreanu, pode ser a resposta óbvia, mas ele é sempre divertido, está sempre falando e, como você disse sobre as pessoas que jogam no Brasil, ele tem aquela atitude de fazer o poker ser divertido, então como fã ainda é meu favorito para assistir.

Você sabia que tem muitos fãs no Brasil?
É engraçado, porque eu não sabia disso, mas fui assistir uma mesa final na WSOP em que o Chris Moorman estava enfrentando um brasileiro [Bernardo Dias] e havia muitos brasileiros na torcida, que começaram a falar que gostavam de mim. Foi aí que senti que tinha fãs lá e eles foram muito legais, eu agradeço, é bom saber disso.

Maria Ho - EPT Monte Carlo
Maria Ho – EPT Monte Carlo

Qual é seu local favorito para jogar poker?
Eu amo a África do Sul. Estive lá recentemente para um evento do WPT DeepStacks, foi minha terceira vez lá e gostei muito. Amo Melbourne, na Austrália, mas se eu for para o Brasil, esse pode virar meu lugar favorito para jogar.

Sobre o PokerStars Players Championship, o que você pode dizer?
O fato de que eles conseguiram ter quase um terço do field inscrito por Platinum Pass é insano. Os números falam por si só, muitas pessoas achavam que não seria tão grande, mas o que eles conseguiram fazer aqui foi ótimo. É empolgante porque agora temos que ver qual é o plano deles para superar isso. É muito bom quando alguém está disposto a colocar dinheiro no poker para fazê-lo crescer e ser mais emocionante. Esse PCA trouxe uma sensação diferente de outros, eu já vim sete ou oitro vezes e esse foi o mais emocionante para mim.

Como você se sente sobre a aposentadoria de Vanessa Selbst?
Vanessa foi uma das minhas amigas mais próximas no poker. Eu gosto, na verdade, que ela tenha deixado o poker, porque ela conquistou tanto no jogo, não tinha mais o que provar, já tem um grande currículo. Ela saiu no auge e agora tem um estilo de vida mais saudável. Viajar o tempo todo não é algo que você quer fazer a vida inteira, então ela ter conseguido um trabalho, se aposentado do poker, montado uma família, eu amo isso. Gosto de ver as pessoas se dando bem no poker, mas também conseguindo avançar para outras áreas.

Qual sua opinião sobre Donald Trump?
Eu acho que ele não lida bem com a sua posição de poder. Eu ainda estou chocada que as pessoas votaram nele, mas o problema é que, depois que ele assumiu, teve a chance de tentar fazer o melhor para o povo americano e acho que não fez isso. Eu acredito fortemente que todos têm direito a ter sua opinião. Muitos jogadores de poker entram em discussões políticas no Twitter, mas esse não é meu estilo. Eu não tento convencer as pessoas da minha opinião, mas não tenho coisas boas a dizer sobre Trump.

Quando você está comentando com “Stapes” [Joe Stapleton] e [James] Hartigan, você acompanha o chat da transmissão? Como você lida com mensagens ruins?
Há uns dois anos, eu transmitia sozinha no Twitch, então já estava meio que acostumada aos tipos de comentários que surgem. Eu aprendi a ignorar isso, porque se me importasse com as coisas que as pessoas falam desde que comecei a jogar poker, eu seria miserável. Eu entendo a comunidade, alguns gostam apenas de serem “trolls”, fazerem piadas… eu gosto de rir de mim mesma, se alguém falar algo negativo, eu não levo a sério.

Quais os próximos passos na sua vida?
Saindo daqui, vou para a Austrália para o Aussie Millions, vou jogar, em fevereiro devo estar de volta a Las Vegas para o US Poker Open e eu estarei comentando, então terei muito poker nos próximos meses. Em março é meu aniversário, então espero fazer algo divertido para comemorar.

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