Há cerca de um ano, Steven van Zadelhoff conquistou a maior glória em mais de uma década no poker ao vencer o Main Event do WCOOP. Jogando sob o nick “Svzff”, ele levou a forra de US$ 1.624.502 e o principal título do poker online, mas a forra real acabou sendo bem menor para o holandês, que concedeu entrevista exclusiva para o SuperPoker e revelou que fez uma grande confusão nos momentos que antecederam a vitória.
Para quem acha que a vida de jogadores de poker é fácil, Steven é um exemplo de superação dos desafios e de como a persistência pode levar ao sucesso. Em 2010, ele sofreu uma “Black Friday pessoal”, quando teve que pagar praticamente todo seu bankroll em impostos para o governo holandês e recomeçar do zero.
Hoje, oito anos depois, ele conta que vê o drama pessoal como positivo no fim das contas. Sendo forçado a começar de baixo, o jogador se mudou para Malta e alterou não apenas os hábitos do poker, mas toda sua vida, começando a se dedicar a alimentação saudável, exercícios, entre outras coisas.
Na “melhor forma da vida” e mais preparado do que nunca, Steven agora busca repetir a glória do ano passado e também atingir outros objetivos no poker. Confira a entrevista e conheça a interessante história do jogador que precisou se reinventar e levar a vida de outra forma.
Primeiro, se introduza para o público brasileiro. Quando você começou a jogar, quando virou profissional, coisas assim…
Eu sou Steven van Zadelhoff, mais conhecido online como “Svzff”, especialmente depois da minha vitória no Main Event do WCOOP. Eu comecei a jogar há muito tempo, acho que minha primeira sessão online foi em 2001 ou algo assim, no Paradise Poker e sites assim, que mal existem hoje em dia. Eu comecei a jogar mais em 2004, quando eu ganhei um torneio de US$ 100 no domingo e levei cerca de US$ 25 mil, que era muito dinheiro naquela época, então comecei a jogar praticamente todo dia.
Decidi me profissionalizar em 2007, quando ganhei o Sunday Million e optei por largar meu trabalho porque percebi que havia algo no poker para mim. Sofri um bom tempo após isso, mas nos últimos quatro ou cinco anos tenho sido mais consistente, eu vejo que os resultados estão chegando, então vou manter o que estou fazendo.
Como você lidou com a Black Friday?
Foi bem estranho, nós podíamos continuar jogando em outros sites, eu não lembro exatamente o que fiz nos meses seguintes, mas não lembro de ficar muito tempo sem jogar, então aparentemente havia tráfego suficiente em outros sites para continuar grindando. Claro que foram muitas mudanças, mas eu acabei me dando bem. Tive a minha Black Friday pessoal quando o governo tomou todo meu dinheiro em 2010 (risos), então tive que me mudar, assim como os americanos foram para México ou Canadá, eu tive que ir para Malta e quase que começar de novo, com uma nova vida e um novo bankroll. Isso me tomou um grande tempo, cerca de 5 anos, para definir um processo de aprendizado novamente, mas nos últimos dois ou três anos tenho ido bem e espero seguir melhorando.
Você pode explicar melhor essa situação com o governo?
Apenas uma questão de impostos. Eles implementaram uma nova lei de taxação e, de repente, começaram a cobrar 29% de todas minhas premiações, e eu tinha ganhado o Sunday Million e outros torneios grandes, então de um dia para o outro tive que pagar cerca de US$ 250 mil, que era basicamente tudo que tinha, então tive que começar de novo. Não foi divertido, mas me fez ser quem eu sou hoje, mais forte e positivo do que nunca, então é o que dizem, “o que não te mata, te fortalece”, e eu sou prova viva disso, é como eu me sinto. Na verdade, eu fico feliz que isso tenha acontecido, porque me forçou a redefinir toda a minha vida em ser positivo e forte mentalmente, com um processo de aprendizado correto, para que aprenda todo dia, toda semana, você tem que seguir. Se você cai, tem que se levantar e continuar, no fim é isso que importa.
Sobre seu grande momento, vencer o Main Event do WCOOP, como se sentiu?
É, 15 anos de grind para conseguir uma grande vitória, é basicamente o que nós buscamos e eu consegui ser bem sucedido ali. Você pode ter ouvido falar sobre uma confusão que aconteceu nos números, então eu acabei com um pedaço relativamente pequeno da minha ação. Eu tinha 16%, mas achava que tinha 30% da minha ação, o que foi bem confuso no dia da mesa final, porque eu já tinha cerca de US$ 1 milhão em equidade por ICM quando eu percebi o que tinha acontecido. Foram algumas horas ruins, fiquei bravo comigo mesmo por ter cometido esse erro, mas senti que eu precisava ser forte, conversei com amigos, com um coach meu, e consegui chegar confiante de que ganharia. Uma coisa que eu queria era ganhar sem deal, para conseguir pelo menos um bom dinheiro, e isso deu certo.
Sou muito grato de ter me mantido ali, lutando, e nunca desisti. Foi muito recompensador e espero que seja apenas o início e que nos próximos anos eu consiga mais resultados assim, é para isso que trabalhamos todo dia.
Como você se sente jogando poker ao vivo, é difícil se adaptar do online?
Sim, é uma grande diferença para mim. É estranho, porque eu também jogo poker ao vivo há 15 anos e eu sinto que deveria ser melhor já, mas pelas mesmas razões que eu não era muito bom online há cinco anos, por ter tido um período difícil na minha vida, também não era bom em poker ao vivo. Eu redefini minha vida para ser bom no poker online, mas não pratiquei muito poker ao vivo, não fiz coaching específico para isso. Mais recentemente comecei a me sentir bem no online novamente e agora comecei a colocar mais volume live, indo em torneios na Europa e a WSOP em Las Vegas, que dá muitas oportunidades para praticar a presença na mesa, prestar atenção nas pessoas, em live reads. Acho que melhorei bastante, mas ainda me sinto menos confortável do que no online, apesar de estar aproveitando mais os eventos live.
Quão importante é para um profissional de poker os aspectos fora da mesa, como alimentação, meditação, ter uma vida saudável, etc?
Para mim é muito importante. Eu fui gordo grande parte da minha vida, já cheguei a perder mais de 35 kg e agora estou na melhor forma da minha vida, ganhei controle sobre meu peso. Eu já tinha perdido peso antes, mas não de forma certa, com exercícios, alimentação saudável, e agora acho que estou em um bom equilíbrio. Estudei bastante sobre nutrição, vício em açúcar, a forma correta de se exercitar, então estou ganhando músculo, perdendo gordura, me sentindo confiante, e é claro que isso se reflete no poker. Faço muita meditação, especialmente quando passei pelo período complicado, então estou calmo, extremamente feliz e grato por tudo que posso fazer. Quando acordo, eu mal posso decidir se estudo, vou para a academia ou se jogo, porque tudo é divertido, eu amo tudo o que envolve ser um jogador profissional de poker e isso é incrível. Isso significa que eu consigo me dedicar por muitas horas, porque tenho paixão pelo jogo, e é isso que vai definir se eu serei bem sucedido nos próximos anos. Estou ansioso para provar que não serei um cara que venceu o WCOOP uma vez e nunca mais conseguiu um grande resultado, quero provar que posso ter uma grande vitória novamente.
Você jogou a WSOP neste ano. É realmente um clima diferente de outros torneios?
Sim, com certeza, especialmente o Main Event. O resto da série também é especial, mas eu já fui para outros eventos e você está ali só grindando, tentando fazer algum dinheiro, mas não é especialmente romântico como o Main Event. Quando ele começa, você sente que é isso que você busca durante o ano inteiro. Eu cheguei no Dia 3 neste ano, caí um pouco antes do ITM, mas aconteceram mãos antes desse momento em que eu considero que poderia ter feito melhor, então voltarei no ano que vem, será minha 14ª edição e eu tenho confiança que um dia ganharei algo na WSOP.
Há 15 anos no jogo, quais são seus objetivos, ou até sonhos, no poker?
Um objetivo é ganhar um grande torneio ao vivo. Eu já mostrei que consigo ganhar consistentemente no online, ainda quero provar isso por mais um ou dois anos, porque não é fácil. Mesmo no Brasil, porque há cinco anos víamos os brasileiros como um pouco “malucos”, emocionais demais, e agora existe uma comunidade forte, muitas pessoas que trabalham duro e grande jogadores, então a competição é dura. Mas eu gosto disso, gosto de trabalhar duro, então quero seguir ganhando consistentemente online e também vencer um grande torneio live. Não precisa ser algo como o Main Event da WSOP, claro, mas um bracelete ou um grande torneio na Europa, é um objetivo.
Rankings como o GPI e PocketFives são uma motivação para você ou você não liga muito para isso?
O GPI eu não ligo, até porque não tenho conseguido colocar o volume, então mesmo que eu estivesse mais perto do topo, seria apenas porque dei sorte. No PocketFives, eu definitivamente tento ir bem, eu consegui um bom período há cerca de um ano e meio e fiquei em terceiro lugar, então pensei que seria legal estar na primeira posição em algum momento. Depois caí de novo e deixei meio de lado, mas quando venci o WCOOP, ganhei tantos pontos que fui para primeiro, acho que apenas por uma semana. Mas ainda assim, cheguei lá, e pretendo grindar bastante online para tentar voltar ao top 10. Eu uso apenas como motivação, não é super importante, mas uma vez que você chega lá é legal ver seu nome, é um reflexo de seu trabalho duro.
Você tem ídolos no poker?
São múltiplos aspectos. Existem caras que são muito bons, os jogadores de Super High Roller, os alemães, americanos, que são uma inspiração, não que eu queira jogar nesse nível, porque estou muito longe disso no poker ao vivo. As coisas que eles precisam fazer para conseguir chegar nesse nível me inspiram para chegar lá. Também existem caras online que eu enfrento todo dia, como o C.Darwin2, que são muito bons e também uma inspiração para seguir trabalhando duro e tomar boas decisões. É apenas uma questão de trabalhar e colocar o volume. Basicamente todo mundo que é bem sucedido por um longo período é uma inspiração para mim.
Qual sua opinião sobre Phil Hellmuth?
Eu não acho que ele é, necessariamente, um ser humano ruim. Acho que ele acredita nas coisas que faz, mas não é o meu estilo, acho que é estranho e bem longe dos meus valores. Eu posso entender que seja bom para a audiência, para a televisão, então não me importo muito, mas pessoalmente não gosto. Você pode ser positivo e aberto, não precisa ser tão emotivo e crítico, é um pouco demais, eu gosto de um show, mas um show positivo. Espero que em alguns anos eu possa ser bem sucedido como ele para dar um exemplo melhor.